A maculada presidente deveria renunciar agora
As
dificuldades de Dilma Rousseff tem se aprofundado por meses. Os
grandes escândalos envolvendo a Petrobras, a gigante estatal
petrolífera da qual ela foi presidente, tem envolvido algumas
das pessoas mais próximas à ela. Ela preside sobre uma
economia sofrendo sua pior recessão desde 1930, principalmente
por erros que ela cometeu durante seu primeiro mandato. Sua fraqueza
política tem deixado seu governo quase impotente frente ao
crescimento do desemprego e na queda do padrão de vida. Suas
taxas de aprovação mal alcançam dois dígitos
e milhões de brasileiros saíram às ruas para gritar
“Fora Dilma”.
E
ainda, até agora, a presidente brasileira poderia com justiça
reivindicar que a legitimidade conferida pela sua reeleição
de 2014 estava intacta e que nenhuma das acusações
feitas contra ela justificariam seu impeachment. Como os juízes
e a polícia que está investigando algumas das mais
importantes figuras do Partido dos Trabalhadores (PT), ela poderia
dizer de cara limpa do seu desejo de ver a justiça feita.
Agora
ela afundou essas vestes de credibilidade. No dia 16 de março,
Dilma fez uma decisão extraordinária de nomear seu
antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, para ser o chefe de seu
gabinete. Ela retratou isso como um lance perspicaz. Lula, como ele é
conhecido, é um operador político sagaz: ele poderia
ajudar a presidente a sobreviver à tentativa do Congresso de
impeacha-la, e talvez estabilizar a economia. Mas dias antes, Lula
tinha sido rapidamente detido para interrogatório por ordem de
Sérgio Moro, o juiz federal responsável pelas
investigações da Petrobras (chamada de Lava-Jato), em
que há a suspeita que o ex-presidente lucrou com o esquema de
propinas. Promotores do Estado de São Paulo acusaram Lula de
esconder sua propriedade de um condomínio de fente ao mar. Ele
nega essas acusações. Ao adquirir o posto de ministro,
Lula teria imunidade parcial. Somente a Suprema Corte poderia
julga-lo. Eventualmente, um juiz do STF suspendeu sua nomeação.
Esse
jornal tem longamente argumentado que o sistema jurídico ou os
eleitores - não políticos interesseiros tentando
impeacha-la - deveriam decidir o destino da presidente. Mas a
nomeação de Lula por Dilma parece uma tentativa
grosseira de impedir o curso da Justiça. Mesmo que não
fosse a intenção dela, esse seria o efeito. Foi o
momento quando a presidente escolheu os estreitos interesses do seu
grupo político sobre o império da lei. Ela assim se
tornou inapropriada para permanecer presidente.
Três
formas de deixar o Planalto
Como
ela sairá do Planalto tem grande importância. Nós
continuamos a acreditar que , na falta de provas de crimes, o
impeachment de Dilma é injustificável. O procedimento
contra ela no Congresso é baseado em alegações
sem provas que ela maquiou as contas públicas para esconder o
verdadeiro tamanho do deficit orçamentário de 2015.
Isso parece um pretexto para tirar uma presidente impopular. A ideia,
apresentada pelo líder do comitê do impeachment, que os
congressistas que irão deliberar o destino de Dilma
ouvirão “a voz das ruas” apontaria para um preocupante
precedente. Democracias representativas não deveriam ser
governadas por protestos e pesquisas de opinião.
Há
três formas de retirar Dilma que repousam em fundamentações
mais legítimas. A primeira seria mostrar que ela obstruiu as
investigações sobre a Petrobras. Alegações
de um senador do PT (Delcídio do Amaral) que ela fez isso
talvez forme agora a base para um segundo pedido de impeachment, mas
até agora não há provas e ela nega ter feito
isso; Dilma ter tentado proteger Lula de uma ação penal
talvez forneça mais fundamentos. Uma segunda opção
seria uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de
convocar novas eleições. Talvez façam isso se
descobrirem que a campanha de reeleição de 2014 foi
financiada com propinas fornecidas através de executivos da
Petrobras. Mas essa investigação será demorada.
A melhor e mais rápida maneira de Dilma deixar o Planalto
seria ela renunciar antes de ser mandada embora.
O vice-presidente Michel Temer
A
sua partida ofereceria ao Brasil a chance de um novo começo.
Mas a renúncia da presidente não iria, por si mesma,
resolver os muitos problemas fundamentais do Brasil. Seu lugar seria
inicialmente tomado pelo vice-presidente Michel Temer, líder
do PMDB. Temer poderia liderar um governo de união nacional,
incluindo os partidos de oposição, quais, em teoria,
deveriam ser capazes de embarcar nas reformas fiscais, necessárias
para estabilizar a economia e acabar com um deficit orçamentário
que está perto de 11% do PIB.
Infelizmente,
o partido de Temer está tão profundamente envolvido no
escândalo da Petrobras quanto o PT. Muitos políticos que
se apoiariam um governo de união, incluindo alguns da
oposição, são popularmente vistos como
representantes de uma desacreditada classe dirigente. Em um congresso
de 594 membros, 352 enfrentam acusações de malfeitos
criminais. Uma nova eleição presidencial iria dar aos
eleitores uma oportunidade de confiar as reformas à um novo
lider. Mas mesmo isso seria deixar a legislatura podre até
2019.
O
judiciário, também, tem questões a responder. Juízes merecem grandes créditos por chamar à
responsabilidade os maiores empresários e políticos,
mas eles tem minado a sua causa por desprezarem as normas legais. O
último exemplo é a decisão de Sergio Moro de
liberar gravações telefônicas de conversas entre
Lula e seus aliados, incluindo Dilma. Muitos juristas acreditam que
somente o STF poderia divulgar conversas em que uma das partes tem
imunidade legal, como a presidente possui. Isso não justifica
a alegação dos defensores do governo que os juízes estão armando um “golpe”. Mas torna fácil para os
investigados na Lava-Jato desviar a atenção de seus
próprios erros para os equívocos de seus
investigadores.
Juiz Sérgio Moro
A
guerra de partidos e personalidades no Brasil obscurece algumas das
mais importantes lições da crise. Tanto o escândalo
da Petrobras e a crise econômica tem suas origens nas leis e
práticas equivocadas que são muito antigas. Retirar o
Brasil dessa bagunça requer mudança por atacado:
controlar os gastos públicos, incluindo as pensões.
Revisão geral das esmagadoras altas de impostos e leis
trabalhistas. E reformar um sistema político que encoraja a
corrupção e enfraquece os partidos políticos.
Essas reformas não podem mais ser adiadas. Aqueles que gritam “Fora Dilma” nas ruas deveriam reivindicar vitória se ela estiver deposta. Mas para o Brasil realmente ganhar seria somente o primeiro passo.
Fonte: The Economist